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Crítica: "Chappie", de Neill Blomkamp



Com (o brilhante) "Distrito 9", o sul-africano Neill Blomkamp assumiu-se como um dos mais interessantes cineastas emergentes do panorama cinematográfico mundial, mostrando-se capaz de criar uma crítica social ácida ao Apartheid, e a xenofobia que hoje em dia ainda se manifesta na África do Sul, uns anos depois Blomkamp regressou com o mais hollywoodesco "Elysium", um épico espacial, que funcionava como uma alegoria para a luta de classes, agora o realizador volta à Joanesburgo, que serviu de pano de fundo para a sua primeira fita, com este objecto único e infinitamente fascinante que é "Chappie".





Logo no início, é criado um cenário que remete para "Robocop" (1987), apresentando-nos um universo onde as autoridades recorrem a agentes robóticos para combater o crime. Quem ganha com isso é a TetraVal, uma empresa de armamento altamente cotada na bolsa, com contratos de fornecimento para mais unidades já agendados. No meio de tudo isto, estão Ninja, Yo Landi (interpretados pela dupla de rappers sul-africanos Die Antwoord, que trazem ao filme uma fabulosa bizarria kitsch), e Amerika um trio de criminosos de "segunda categoria", com uma dívida de 20 milhões de rands a um bandido local (um psicopata de rastas e metralhadora que parece saído de "Mad Max"). Assim nasce um plano para raptar Deon (Dev Patel), o criador desta tecnologia que, entretanto, está empenhado em criar um novo firmware que dará às máquinas que criou a possibilidade de pensar e sentir.





E, assim nasce este "Chappie", uma aventura de ficção-científica trepidante, frenética, divertida e humana, na qual Blomkamp levanta uma variedade de importantíssimos dilemas sociais (o efeito que o espaço e as pessoas que rodeiam um indivíduo podem ter na sua formação, por exemplo) de grande ressonância emocional, que fazem da obra um exemplo perfeito daquilo que um blockbuster pode e deve ser, ou seja, entretenimento inteligente e visualmente espantoso.

10/10
Miguel Anjos

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