Avançar para o conteúdo principal
"Marcas de Guerra" ("Thank You For Your Service"), de Jason Hall



Pensemos em “Os Melhores Anos das Nossas Vidas” (1950). Clássico intemporal, acerca do regresso a casa de um trio de veteranos da Segunda Guerra Mundial. E, agora pensemos num equivalente contemporâneo a esse título de William Wyler. De forma mais ou menos simplista, poderemos descrever assim esta primeira longa-metragem de Jason Hall, “escriba” de “Sniper Americano” (Clint Eastwood, 2014), que volta às lutas quotidianas, de quem precisa urgentemente de uma ajuda que teima em não vir, neste digníssimo melodrama classicista, bem à moda de uma certa produção americana “à antiga”. Nele, retratam-se as vidas de Adam, Solo e Billy (interpretados com justeza por Miles Teller, Beulah Koale e Joe Cole, respetivamente). Soldados com algumas comissões no Iraque, que chegam à pequena cidade onde residem, depois de um incidente traumático (que, apenas serviria como um infeliz clímax, para longos meses de violência constante), num estado de permanente confusão e melancolia, desesperadamente procurando seguir com as suas vidas, mas sem possuírem forma alguma de comunicar com os que os rodeiam, nem de perceberem o que se passa com eles. É um filme humaníssimo e, apropriadamente discreto, que nunca nos quer dar lições de moral, nem discutir sobre a justiça ou falta dela do conflito em causa. Em “Marcas de Guerra”, apenas vemos um olhar contundente e militantemente realista sobre estes homens, que lentamente se vão apercebendo do quão psicologicamente arrasados realmente estão. E, na sua serena simplicidade, existem momentos impressionantes de cinema, que sozinhos já valeriam o preço do bilhete.


Realização: Jason Hall
Argumento: Jason Hall
Género: Drama
Duração: 109 minutos

Comentários

Mensagens populares deste blogue

"Destroyer: Ajuste de Contas" O falhanço financeiro de um duo de produções conturbadas (“Aeon Flux” e “O Corpo de Jennifer”) remeteram Karyn Kusama a um silêncio demasiado longo. No entanto, em 2016, reencontrámo-la aos comandos de um filme francamente impressionante. Chamava-se “The Invitation” e convidava-nos a entrar na intimidade fantasmática de um homem que não conseguia ultrapassar um acontecimento traumático que o destruiu. Passou completamente ao lado do circuito comercial, contudo, tornou-se num fenómeno de culto em homevideo e deu visibilidade suficiente à sua autora para lhe permitir filmar com um orçamento mais alto (9 milhões), o apoio de um estúdio interessado em auxiliar cineastas ousados (a Annapurna) e um elenco preenchido por nomes sonantes para filmar o seu magnum opus , ou como diriam os românticos alemães do século XIX a sua Gesamtkunstwerk (“obra de arte total”). Trata-se do conto sanguinolento e melancólico de Erin Bell (Nicole Kidman). Uma
"Clímax", de Gaspar Noé Nos primeiros minutos de “Clímax” é-nos providenciado um plano aéreo de uma mulher ensanguentada a percorrer um mar de neve, eventualmente caindo prostrada no branco e nele se distendendo. É a chamada  god’s eye view , um enquadramento da visão divina, que contempla as minúsculas romagens humanas lá do alto, sempre com indiferença. Essa vista alonga-se, para encontrar uma árvore, numa panorâmica lenta que vai abrindo caminho para o horizonte, orientando-se de tal modo que coloca a rapariga no céu e, por conseguinte, Deus na terra. Ainda não terminaram os segundos iniciais da sexta longa-metragem de Gaspar Noé e o mesmo já declarou que as imagens delirantes a que seremos expostos nos seguintes 95 minutos, se encontraram num intervalo permanente e perturbante entre o olhar distante de um qualquer Deus terreno e a lógica sacralizadora de um artista em busca de sensações viscerais. Caso restem dúvidas, o ecrã é imediatamente apoderado por uma
"Juliet, Nua", de Jesse Peretz Quando uma comédia romântica funciona mesmo muito bem, dão-se dois acontecimentos intrinsecamente interligados. Primeiro, começamos a acreditar nas personagens em causa, e a reconhecermo-nos nelas. Segundo, os apontamentos humorísticos convencem-nos tão bem do ambiente de aparente ligeireza, que somos completamente surpreendidos, quando a narrativa nos confronta com temáticas sérias. Felizmente, “Juliet, Nua” constitui mesmo um desses pequenos milagres. Um olhar, simultaneamente, melancólico e hilariante sobre um trio de indivíduos, que tentam encontrar o melhor caminho possível para a felicidade, dentro das situações francamente complexas, que os “assombram”. Resumindo de maneira necessariamente esquemática, esta é a história de Annie (a sempre confiável Rose Byrne), uma mulher de meia-idade, oriunda de uma pequena vila britânica, daquelas onde nunca nada parece acontecer, que namora com o intelectual Duncan (Chris O’Dowd)