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Crítica:

"O Segredo de Marrowbone"


Argumentista de “O Orfanato”, de Juan Antonio Bayona, Sérgio G. Sánchez não possuirá ainda a popularidade de alguns contemporâneos seus, no entanto, esta sua primeira longa-metragem poderá mesmo mudar isso. Essencialmente, um conto classicamente romântico sobre um quarteto de irmãos que juraram nunca separar-se. O resultado anda algures entre as histórias dos Irmãos Grimm e alguns títulos do mexicano Guillermo del Toro.


Tudo acontece numa recôndita vila americana, em 1929. Jack e os seus irmãos mais novos Jane, Billy e Sam, habitam na antiquíssima mansão da família Marrowbone, uma herdade em ruínas abandonada há muitos anos. Inicialmente, aparentam ter finalmente encontrado alguma paz interior, no entanto, depois do falecimento da mãe, o medo de serem enviados para um orfanato, conduz os quatro a enterrar o corpo no jardim da casa e, a manter a sua morte em segredo até Jack fazer 21 anos.



Ora, adiantar mais detalhes sobre a narrativa, implicaria também correr o risco de penetrar no sempre insidioso território dos spoilers, portanto, refugiemo-nos na vagueza para dizer o essencial. Ou seja, Sanchéz encenou meticulosamente um conto de terror à moda antiga, conseguindo mesmo apresentar um bom número de sequências arrepiantes (um momento a envolver uma criança, um lençol e um espelho, assume-se enquanto um destaque óbvio), enraizadas numa atmosfera de permanente mistério. No entanto, esses elementos oriundos do cinema de género funcionam meramente como uma “ponte”, digamos assim, para nos conduzir até ao nosso subconsciente. Esta é, acima de tudo, uma história sobre o valor do amor e dos vínculos inquebráveis que cria. E, que Sanchéz tenha conseguido balançar um thriller empolgante, com um olhar humanista e comovente, é um feito que importa reconhecer.




Realização: Sérgio G. Sánchez
Género: Terror, Drama
Duração: 110 minutos

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