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Crítica: "Submersos"


Wenders permanece um autor francamente incomum. Um humanista confesso, possuidor de marcas pessoalíssimas, que atravessam toda a sua filmografia e, de um sentido de independência que lhe permite continuar alheio a “modas” passageiras e clichés redundantes. Exemplo disso mesmo, é a sua mais recente longa-metragem, “Submersos”, adaptação gentil de um romance do escocês J.M. Ledgard, que encena o romance silencioso entre duas almas solitárias, que relembram os breves momentos que passaram juntas, quando confrontadas com a iminência da morte. Ambas as personagens, partem em missões até lugares de tal modo distantes, que quase apetece fazer referência a um dos mais conhecidos títulos do cineasta alemão, e argumentar que rumam “Até ao Fim do Mundo”. E, é precisamente nessa paixão assolapada por um certo idealismo romântico, sempre assombrado por temas inquietantes que marcam constantemente a nossa atualidade (o terrorismo, sendo um exemplo óbvio). No fim de contas, ficamos com uma história simultaneamente enigmática e transparente, física e metafísica, que se assemelha a um desabafo meio reflexivo em torno da obra de Wenders, e dos cantos e recantos da sua mente que a mesma o força a percorrer eternamente.


Realização: Wim Wenders

Argumento: Erin Dignam


Género: Drama, Romance

Duração: 102 minutos

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