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"Venom", de Ruben Fleischer


Quando as espalhafatosas aventuras dos super-heróis caiem na entediante rotina dos clichés, como continuar a explorar o filão das adaptações de banda-desenhada? Convenhamos, trata-se de um problema complexo, no entanto, Hollywood encontrou uma maneira interessante de o solucionar. Qual? Pois bem, conceber narrativas em torno dos mais emblemáticos vilões desses universos fantasiosos. O mesmo sucede em “Venom”, de Ruben Fleischer. Um conto perturbante sobre o magnetismo do Mal, com pronunciados contornos satíricos, que consegue tornar a aberração mutante homónima, numa personagem de carne e osso, cujas atitudes e pensamentos serão genuinamente humanas.


Em causa, está a odisseia de Eddie Brock, um repórter arrogante, que vê o seu corpo e mente serem consumidos por um parasita esfomeado, com inclinações anárquicas. Acerca dos acontecimentos que se seguem, não avançaremos nenhum tipo de detalhes (no The Corner nem encorajamos, nem praticamos spoilers), no entanto, importa salientar a maneira deveras inteligente como Fleischer vai convocando componentes de um terror muito físico, subtilmente acompanhado por um sentido de humor certeiro, para encenar a história de um homem corroído pelo arrependimento, que precisou de se tornar na corporização de um horror imenso, para aprender como escapar à solidão que o assombra.


Realização: Ruben Fleischer


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