"O Interminável"
Justin Benson e Aaron Moorhead continuam a desconcertar-nos. No melhor sentido, entenda-se. De facto, não nos parece possível encerrar os seus pungentes contos humanistas em qualquer padrão temático preexistente, de tal modo vão ziguezagueando por entre as mais variadas referências. Em “O Interminável” mantêm a melancolia romanesca do anterior “Spring”, bem como os seus contornos lovecraftianos, no entanto, é no arrepiante e enigmático universo da sua primeira longa-metragem, “Resolução Macabra”, que tudo acontece.
Aaron (Aaron Moorhead) e Justin (Justin Benson) são dois irmãos, que passaram a infância juntos num culto, no seio de uma floresta, nas imediações da Califórnia, contudo, quando o primeiro ouviu rumores acerca da eminência de um possível ritual de suicídio coletivo, ambos partiram em direção à Los Angeles.
Justin ambientou-se ao local, e encontrou alguma paz, Aaron vive corroído por uma nostalgia doentia, que o vai assassinando lenta e silenciosamente. Isto é, até que deparam com uma cassete de vídeo (o anacronismo da tecnologia em causa não é um mero acessório, até os telemóveis pertencem a outra era, e o filme nunca nos providencia datas para os acontecimentos que testemunhamos), onde uma das suas antigas companheiras anuncia a chegada de uma aparente “Ascensão”. Justin jurou nunca retornar, mas, a necessidade de ajudar o irmão a encerrar esse capítulo das suas vidas, vence a sua relutância, e conduz o duo até “casa”.
Ora, o brilhantismo do trabalho de Benson e Moorhead reside mesmo na forma como transformam essa escolha num catalisador de mudança, tanto para as personagens, como para nós. Como assim? Pois bem, se até aí, tudo nos era comunicado num regime de realismo minimalista, muito similar ao que veríamos no trabalho de autores como Richard Linklater ou os irmãos Mark e Jay Duplass, o que se segue assume uma qualidade disruptiva, que consegue mesmo alterar a perceção do tempo e espaço do público, diluindo as suas barreiras até se tornarem em meras emoções.
Aliás, mesmo que lhe reconheçamos elementos satíricos francamente deliciosos, que evidenciam um talento inato para aquele humor meta-referencial, que Wes Craven dominava como ninguém, e uma vontade de reinventar um subgénero cansado (os contos de terror sobre cultos profanos), a ousadia dramática de “O Interminável” é demasiado grande, para o reduzirmos a um simples exercício de reinterpretação cinéfila, aquilo que Benson e Moorhead nos oferecem aqui, é isso sim, uma serena meditação acerca dos fantasmas do arrependimento, e a inabilidade da mente humana de entender todos os mistérios levantados pela nossa condição.
Um dos melhores filmes do ano...
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