Avançar para o conteúdo principal
Crítica: "Blade Runner 2049", de Denis Villeneuve


Villeneuve convence-nos desde “Incendies: A Mulher Que Canta”. E, de um cineasta que conseguiu conceber acontecimentos como “Raptadas” ou “Sicario”, não podíamos nunca esperar pouco. No entanto, mesmo para um autor de tamanho talento, continuar a história começada por Ridley Scott no justamente icónico “Blade Runner”, aparentava mesmo ser uma daquelas tarefas ingratas, que pouquíssimas hipóteses teriam de correr bem (não será descabido, mencionar que se assumem perguntas similares a “Como continuar um mundo tão intrinsecamente complexo quanto este?”). Só que, Villeneuve é mesmo um mestre em completo domínio do seu métier e, ao recuperar os temas e a subversão do original (afinal, falamos de um filme, que começava por nos apresentar a um herói lacónico, que perseguia criminosos com uma arma futurística, só para depois nos levar a reconsiderar essas ideias de “heroísmo” e “vilania”) e, enquadrando-os num contexto, que vai muito além da cópia ou da homenagem, ao invés apresentando algo único. Assim, vamos caminhando entre as paisagens futuristas deste universo distópico, belissimamente filmadas por Roger Deakins (num dos melhores momentos da sua carreira), à medida que acompanhamos um Gosling psicologicamente atormentado, que necessita de resolver um mistério, que poderá ou não estar relacionado com a sua humanidade. O resultado é uma estonteante odisseia intimista e épica, que tanto funciona como um noir futurista extremamente empolgante e, um drama filosófico constantemente comovente como poucos (uma das sequências finais com Ryan Gosling numa escadaria, é simplesmente arrasadora), que corresponde a uns 163 minutos de puríssimo cinema.


Realização: Denis Villeneuve
Género: Drama, Ficção-Cientifica
Duração: 163 minutos

Comentários

Mensagens populares deste blogue

CRÍTICA - "THE APPRENTICE - A HISTÓRIA DE TRUMP"

"The Apprentice", em Portugal, acompanhado pelo subtítulo "A História de Trump", tornou-se num dos filmes mais mediáticos do ano antes de ser revelado ao público, em maio, no Festival de Cannes, "poiso" habitual do seu autor, o iraniano-sueco-dinamarquês Ali Abbasi. De facto, os tabloides tiveram muito por onde pegar, houve um apoiante de Donald Trump que, inconscientemente, terá sido um dos financiadores de "The Apprentice" (só podemos especular que terá assumido que o filme se tratava de uma hagiografia, de pendor propagandístico), a campanha de boicote que Trump e a sua comitiva lançaram contra o filme, a dificuldade de encontrar um distribuidor no mercado norte-americano (nenhum estúdio quer ter um possível Presidente como inimigo), etc. A polémica vale o que vale (nada), ainda que, inevitavelmente, contribua para providenciar um ar de choque a "The Apprentice", afinal, como exclamam (corretamente) muitos dos materiais promocionais ...

"Flow - À Deriva" ("Straume"), de Gints Zilbalodis

Não devemos ter medo de exaltar aquilo que nos parece "personificar", por assim dizer, um ideal de perfeição. Consequentemente, proclamo-o, sem medos, sem pudores, "Flow - À Deriva", do letão Gints Zilbalodis é um dos melhores filmes do século XXI. Um acontecimento estarrecedor, daqueles que além de anunciar um novo autor, nos providencia a oportunidade rara, raríssima de experienciar "cinema puro". O conceito é simultaneamente simples e complexo. Essencialmente, entramos num mundo que pode ou não ser o nosso, onde encontramos apenas natureza, há resquícios do que pode, eventualmente, ter sido intervenção humana, mas, permanecem esquecidos, abandonados, nalguns casos, até consumidos pela vegetação. Um dia, um gato, solitário por natureza, é confrontado com um horripilante dilúvio e, para sobreviver, necessita de se unir a uma capivara, um lémure-de-cauda-anelada e um cão. Segue-se uma odisseia épica, sem diálogos, onde somos convidados (os dissidentes, cas...

"Oh, Canada", de Paul Schrader

Contemporâneo de Martin Scorsese, Steven Spielberg e Francis Ford Coppola, Paul Schrader nunca conquistou o estatuto de "popularidade" de nenhum desses gigantes... e, no entanto (ou, se calhar, por consequência de), é, inquestionavelmente, o mais destemido. Em 1997, "Confrontação", a sua 12ª longa-metragem, tornou-se num pequeno sucesso, até proporcionou um Óscar ao, entretanto, falecido James Coburn. Acontece que, o mediatismo não o deslumbrou, pelo contrário, Schrader tornou-se num cineasta marginal, aberto às mais radicais experiências (a título de exemplo, mencionemos "Vale do Pecado", com Lindsay Lohan e James Deen). Uma das personas mais fascinantes do panorama cultural norte-americano, parecia ter escolhido uma espécie de exílio, até que, "No Coração da Escuridão", de 2017, o reconciliou com o público. Aliás, o filme representou o início de uma espécie de trilogia, completada por "The Card Counter: O Jogador", em 2021, e "O ...