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Crítica

"Ela", de Paul Verhoeven



Título Original: "Elle"
Realização: Paul Verhoeven
Argumento: David Birke
Elenco: Isabelle Huppert, Laurent Lafitte, Anne Consigny, Charles Berling, Virginie Efira
Género: Drama, Thriller
Duração: 130 minutos
País: França
Ano: 2016
Distribuição: Midas Filmes
Classificação Etária: M/16
Data de Estreia (Portugal): 17/11/2016


Crítica: Será um filme de terror com monstros de carne e osso, que se escondem sobre a fachada de uma existência meramente banal? Uma comédia negra amoral? Um filme de suspense, que se recusa a cair nos clichés mais ou menos banais que por norma abundam nesse estilo de produções? Ou até mesmo um drama feminista? É tudo isto e mais, muito mais, porque na sua primeira longa-metragem numa década, o holandês Paul Verhoeven foi construir um pequeno monumento cinematográfico, que não se parece com nada que já tenhamos visto antes. Nele, acompanhamos a odisseia de Michéle, uma empresária de jogos de vídeo e filha de um assassino em série, que é violada em casa por um mascarado logo na primeira cena, em frente ao seu gato (ele que é a primeira personagem a marcar a presença no ecrã). E, em vez de reagir como seria de esperar, Michéle toma as devidas precauções (compra um spray de autodefesa e um machado de alpinista) e continua com a sua vida como se nada tivesse acontecido. Dizer mais, claro está seria estragar as muitas e deliciosamente retorcidas surpresas que o cineasta guardou para o espetador, por isso, digamos apenas que ao subverter constantemente as expectativas que criamos para ela, esta nova fita relembra-nos o porquê de há já tanto tempo atrás nos termos apaixonado pelo cinema de um autor tão único como Verhoeven. Em "Ela" nunca nos oferece terreno seguro para pisar, mantendo sempre uma atmosfera de dúvida e suspense, que à medida que avançamos se confunde com uma tensão erótica palpável, enquanto navegamos por este universo dominado por aparências, onde abundam as mentiras e os enganos. Nesse sentido, não haverá também como ignorar a sempre imperial Isabelle Huppert, na sua mais estonteante prestação desde "A Pianista".

Texto de Miguel Anjos

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