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"Derradeira Viagem", de Richard Linklater



Richard Linklater permanece fiel aos valores humanistas que sempre guiaram o seu cinema. Assim sendo, aquilo que encontramos num título notável como “Derradeira Viagem é novamente o trabalho de um autor engenhoso e empático, quase única e exclusivamente interessado em filmar-nos. A nós e aos nossos problemas quotidianos, sempre com o devido tato narrativo, e sem nunca sentir a necessidade de tirar dividendos melodramáticos postiços ou estereotipar as suas personagens. Por outras palavras, realismo contundente, apresentando com ligeireza de tom e portento intelectual. Desta forma, o texano concebeu com este conto de um trio de ex-combatentes da Guerra do Vietname, que se reúnem para enterrar o filho de um deles (morto no Iraque…), uma requintadíssima longa-metragem, que não se assemelha a nenhuma outra no género em anos recentes. Invernal e melancólico, este é um cruzamento inspirado entre a comédia de amigos e o drama sobre a perda. Uma meditação pensativa acerca da futilidade da guerra, as consequências do patriotismo, o peso da honra e, como qualquer filme de Linklater, um olhar arrasador sobre a passagem inexorável do tempo, e os seus efeitos arrasadores nos nossos corpos, nas nossas almas.

Realização: Richard Linklater
Argumento: Richard Linklater

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