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Crítica: Nunca Digas Nunca (And So It Goes), de Rob Reiner


Não deixa de ser interessante de reparar que Rob Reiner, em tempos uma verdadeira lenda de Hollywood realizador de verdadeiros clássicos como "Um Amor Inevitável", "Conta Comigo", "Uma Questão De Honra", entre variadíssimos outros, é hoje um cineasta verdadeiramente marginal dentro do sistema de produção cinematográfica americano. Não que os seus filmes estejam hoje diferentes, muito pelo contrário, o que se passa é que a indústria mudou, e os grandes estúdios, cada vez mais e com poucas exceções já não têm interesse em "pequenos" filmes como são os de Reiner, concentrando-se ao invés em grandes produções executadas com o objetivo de criar franchises, empurrando aqueles que eram outrora os líderes da indústria para uma periferia (o que atenção não é uma crítica, apenas um facto que importa ser discutido).
Porém, apesar de já não ter o apoio das grandes produtoras (nem da crítica) Reiner continua um cineasta plenamente ativo na sua arte, e acima de tudo fiel às qualidades que fizeram dele quem é hoje (e ainda bem),  e este "Nunca Digas Nunca", é só mais um exemplo disso.
Um filme que apesar de sofrer de algumas imperfeições típicas do género, como a previsibilidade do enredo (construído sobre fórmulas já bem assentes na filmografia do seu realizador), acaba por suplantá-las com rapidez e eficácia bem típicas do seu cineasta.
Para já temos desde logo de afirmar, que uma das grandes mais valias de Reiner continua a afirmar-se neste seu mais recente trabalho, falo da forma como este consegue sempre com facilidade equilibrar o drama e a comédia sem nunca descurar nenhum, e evitando sempre que o filme caia na pieguice e/ou parvoíce,  para isto ajuda também um estilo de humor inteligente que fluí naturalmente de situações comuns da vida mundana, que aqui advêm de um argumento bem trabalhado que humaniza as suas personagens através de um desenvolvimento constante das mesmas (algo raro nas comédias românticas que hoje em dia se produzem).
Além disso notamos aqui também outra qualidade do cineasta é ela o seu imenso talento para o casting com Michael Douglas e Diane Keaton a elevarem o material e a providenciarem todo um novo charme a uma obra já de si bastante sólida.
E no todo "Nunca Digas Nunca" é um excelente exemplo daquilo que um feel-good movie pode e deve ser divertido e tocante, sempre corajoso o suficiente para enfrentar as situações mais melancólicas que na vida ultrapassamos (a perda, por exemplo), apenas para depois se mostrar "ousado" (digamos assim) o suficiente para as enfrentar com um sorriso. Reiner após tantos anos de carreira conhece o valor de um final feliz, e oferece-nos aqui um filme que no fundo só quer fazer com que nos sintamos melhor, é uma obra de uma enorme e desarmante simplicidade, com um charme, uma subtileza que hoje em dia já não vemos no género. Uma pequena e curiosa pérola a ser descoberta nas salas.
9/10

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