CRÍTICA - "THE APPRENTICE - A HISTÓRIA DE TRUMP"

 "RIFKIN'S FESTIVAL"

HOLLYWOOD COLOCOU WOODY ALLEN DE LADO PERMANENTEMENTE, LEVANDO MESMO AO APARECIMENTO DE DISCURSOS QUE TENTAM QUESTIONAR O LUGAR INAMOVÍVEL QUE O AUTOR DE "ANNIE HALL" E "MANHATTAN" OCUPA NA HISTÓRIA DO CINEMA CONTEMPORÂNEO (AMERICANO OU NÃO), NO ENTANTO, ISSO NÃO O IMPEDIU DE CONTINUAR A SER EXTRAORDINARIAMENTE PROLÍFICO, MANTENDO UMA INVEJÁVEL MÉDIA DE UM FILME POR ANO AOS 85 ANOS...

EM "RIFKIN'S FESTIVAL", ENCONTRAMO-LO EM TERRITÓRIO FAMILIAR. ISTO É, A ENCENAR AS DEAMBULAÇÕES DE UM NOVA-IORQUINO INTELECTUAL E NEURÓTICO QUE PROCURA UMA RESPOSTA PARA AS GRANDES PERGUNTAS (QUAL É O SENTIDO DA VIDA? SERÁ QUE A EXISTÊNCIA SE LIMITA AO TEMPO QUE PASSAMOS NO PLANO TERRENO OU HAVERÁ ALGO MAIS?), ENQUANTO ANDA À DERIVA NO INTERIOR DA SUA PRÓPRIA HISTÓRIA, TENDO COMO PANO DE FUNDO UMA CIDADE EUROPEIA, NESTE CASO, SAN SEBÁSTIAN, QUE ALLEN TRANSFORMA NUM CENÁRIO DE INFINITOS PARADOXOS, ONDE O ENCANTO DOS LUGARES ACOLHE AS GRANDEZAS DOS HUMANOS, EXPONDO TAMBÉM AS SUAS MISÉRIAS.

WALLACE SHAWN INTERPRETA A PERSONAGEM TITULAR, MORT RIFKIN, UM PROFESSOR DE CINEMA REFORMADO QUE AMBICIONA ESCREVER UM GRANDE ROMANCE, REMINISCENTE DE JOYCE E DOSTOIÉVSKI, CONTUDO, O BLOQUEIO CRIATIVO EM QUE SE ENCONTRA NÃO LHE PERMITE FAZER QUAISQUER AVANÇOS NESSA POSSÍVEL OBRA-PRIMA. CERTO DIA, ACEITA RELUTANTEMENTE ACOMPANHAR A MULHER SUE (GINA GERSHON), QUE TRABALHA COMO RELAÇÕES PÚBLICAS DE CINEMA, AO FESTIVAL DE SAN SEBASTIÁN. ELA TEM A SEU CARGO A AGENDA DE UM PRETENSIOSÍSSIMO CINEASTA FRANCÊS, PHILIPPE (LOUIS GARREL), QUE PLANEIA RODAR UM FILME QUE ENCONTRE UMA SOLUÇÃO PARA O CONFLITO ENTRE ÁRABES E ISRAELITAS NO MÉDIO ORIENTE ("AINDA BEM QUE ELE SE VAI VIRAR PARA A FICÇÃO-CIENTIFICA", IRONIZA MORT AO OUVIR A NOTÍCIA).

PRESSENTINDO QUE SUE ESTÁ À BEIRA DE SE ENVOLVER SEXUAL OU ROMANTICAMENTE COM O JOVEM E SEDUTOR PHILLIPE, RIFKIN COMEÇA A SOFRER DE ANSIEDADE E A TER PALPITAÇÕES, LEVANDO-O A CONSULTAR A MÉDICA JO (ELENA ANAYA), A CONSELHO DE UM AMIGO, POR QUEM RAPIDAMENTE DESENVOLVE UMA ENORME AFEIÇÃO, MAS É UM TANTO OU QUANTO IMPROVÁVEL QUE A DOUTORA ESTEJA DISPONÍVEL A ABANDONAR O PINTOR (SERGI LÓPEZ) COM QUEM TEM UM CASAMENTO CONFLITUOSO, PARA INICIAR UM ROMANCE COM RIFKIN.

SEGUE-SE UMA GALERIA DE PEQUENOS MOMENTOS, SEMPRE A OSCILAR ENTRE A IRRISÃO TÍPICA DO SENTIDO DE HUMOR DE ALLEN E O MAIS SINGELO DRAMA, COM UM PEQUENO BÓNUS QUE É TUDO MENOS SECUNDÁRIO, É QUE O FILME É PONTUADO PELOS SONHOS CINEMATOGRÁFICOS DO PROTAGONISTA, EM QUE MORT DÁ POR SI NO INTERIOR DE ALGUNS DOS CLÁSSICOS QUE MAIS AMA ("CITIZEN KANE", "JULES E JIM", "O ACOSSADO" OU "O SÉTIMO SELO", MENCIONANDO APENAS ALGUNS), ASSUMINDO DIRETAMENTE A INFLUÊNCIA QUE O CINEMA SEMPRE TEVE SOBRE A OBRA DE WOODY ALLEN, NESSE SENTIDO, ESTA ACABA TAMBÉM POR SER UM HOMENAGEM AO PODER UNIVERSAL DA SÉTIMA ARTE, NÃO SENDO SEQUER DE DESCURAR O FACTO DE NENHUM DOS TÍTULOS MENCIONADOS SEREM FALADOS EM INGLÊS. NUM PERÍODO TEMPORAL EM QUE TRISTES ESPETÁCULOS COMO "STRANGER THINGS" OU "FEAR STREET" PARECEM ACHAR QUE BASTA COLECIONAR PEQUENAS "MENÇÕES" A TÍTULOS DO PASSADO, É EQUIVALENTE A UMA DIGNA HOMENAGEM AO SEU LEGADO, É BOM ENCONTRAR ALGUÉM QUE CONTINUA A SABER COMO DIALOGAR COM O PASSADO.

NÃO SERÁ PRECISO SUBLINHAR QUE ESTE CINEMA DE DESARMANTE SIMPLICIDADE, ONDE A COMPLEXIDADE DA MISE EN SCÈNE RECUSA QUALQUER MODO DE OSTENTAÇÃO, CONTINUA A SER INDISSOCIÁVEL DO TRABALHO DOS ATORES, DESDE O PROTAGONISTA WALLACE SHAWN (ANTIGO COLABORADOR DE LOUIS MALLE), A DAR CORPO E VERBO AO "ALTER-EGO" DO REALIZADOR COM UMA GRACIOSIDADE INQUESTIONÁVEL, ATÉ À EXTENSA DE GALERIA DE SECUNDÁRIOS QUE TANTO INCLUI O ESTONTEANTE GARREL, A SATIRIZAR O PEDANTISMO DE MUITOS JOVENS "AUTORES" ATUAIS, AO ENORME CHRISTOPH WALTZ, NUMA PEQUENA PARTICIPAÇÃO, MAS DELICIOSA PARTICIPAÇÃO.

★★★★★

TEXTO DE MIGUEL ANJOS