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Crítica: "Bullet Head: O Último Golpe"


Infelizmente, as lutas de cães são uma realidade. No entanto, só muito raramente vemos cineastas ousados a ponto de as abordarem nos seus filmes. E, convenhamos, é francamente penoso que assim seja, uma vez que o cinema permanece como uma importante ferramenta informativa, podendo trazer para a ordem do dia tem áticas que continuamos a encarar como tabus. Nesse sentido, importará realçar o trabalho do americano Paul Solet, que escolheu encenar este pequeno conto sobre as complexas relações entre humanos e cães, em estilo de thriller policial à moda antiga. Essencialmente, seguimos um trio de assaltantes, que se refugiam no interior de um armazém aparentemente abandonado, depois de um golpe mal-sucedido, que culminou no falecimento de um quarto membro. O problema é que naquela mesma infraestrutura decrépita, ainda reside um perigoso pitbull, violentamente treinado para os horrores das lutas de cães, que ali tinham tido lugar na noite anterior… Os acontecimentos que se sucedem, vão sendo astutamente divididos entre a perspetiva dos protagonistas e do cão em causa (em múltiplas ocasiões estamos mesmo a acompanhar a narrativa, pelo seu olhar), que mesmo representando um a ameaça nunca é retratado como um vilão, ao invés assumindo o papel de uma figura trágica, irreversivelmente marcada por anos de profundos abusos. Desta for ma, o que poderia ser meramente uma repetição cansada dos moldes inventados por “Cujo”, acaba por se transformar num olhar duro e comovente, que tem tanto de thriller psicológico como melodrama à antiga.


Realização: Paul Solet
Argumento: Paul Solet
Género: Thriller
Duração: 93 minutos

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