Avançar para o conteúdo principal
Crítica: "Verdade ou Consequência"


Apesar das muitas tentativas recentes de o revitalizar, o musical morreu permanentemente e, o western permanece unicamente como uma reflexão moral sobre as escolhas, digamos, moralmente questionáveis do seu passado (nomeadamente, na maneira como os cineastas dos anos 50/60 escolheram retratar autênticos massacres como atos de heroísmo). Porém, o slasher aparenta mesmo estar a regressar aos nossos ecrãs, dada a elevada contagem de contos sanguinolentos acerca de jovens universitários, que enfrentam forças malignas que escapam ao seu controlo e lhes ameaçam a vida. “Verdade ou Consequência” é mais uma dessas aventuras, no entanto, debaixo de uma superfície imaculada (a cinematografia tem aquele ar glossy, que associamos sempre a estas produções de estúdio), encontramos uma fita bem mais subversiva do que seria de esperar. No epicentro da narrativa, está um grupo de amigos, que quando confrontados com o final da faculdade e, a necessidade de abraçar um novo mundo responsabilidades, decidem rumar ao México para um entoar um último grito de liberdade. Mas, rapidamente se veem no interior de uma igreja envelhecida, onde um estranho os convence a começar um jogo de verdade ou consequência. Imediatamente notamos algum desconforto entre os participantes e, o cineasta e co-argumentista Wadlow aproveita o desconhecimento que as personagens obviamente tem em relação aqueles que supostamente seriam os seus melhores amigos, para conceber 100 minutos de apropriados sustos, com um curioso subtexto social, apresentando metodicamente a personalidade das suas personagens, só para depois as utilizar contra elas, no processo, expondo as imensas contradições que encerram em si e, a maneira como enganam o mundo que as rodeia e a si mesmas.


Realização: Jeff Wadlow
Género: Terror
Duração: 100 minutos

Comentários

Mensagens populares deste blogue

CRÍTICA - "THE APPRENTICE - A HISTÓRIA DE TRUMP"

"The Apprentice", em Portugal, acompanhado pelo subtítulo "A História de Trump", tornou-se num dos filmes mais mediáticos do ano antes de ser revelado ao público, em maio, no Festival de Cannes, "poiso" habitual do seu autor, o iraniano-sueco-dinamarquês Ali Abbasi. De facto, os tabloides tiveram muito por onde pegar, houve um apoiante de Donald Trump que, inconscientemente, terá sido um dos financiadores de "The Apprentice" (só podemos especular que terá assumido que o filme se tratava de uma hagiografia, de pendor propagandístico), a campanha de boicote que Trump e a sua comitiva lançaram contra o filme, a dificuldade de encontrar um distribuidor no mercado norte-americano (nenhum estúdio quer ter um possível Presidente como inimigo), etc. A polémica vale o que vale (nada), ainda que, inevitavelmente, contribua para providenciar um ar de choque a "The Apprentice", afinal, como exclamam (corretamente) muitos dos materiais promocionais ...

"Flow - À Deriva" ("Straume"), de Gints Zilbalodis

Não devemos ter medo de exaltar aquilo que nos parece "personificar", por assim dizer, um ideal de perfeição. Consequentemente, proclamo-o, sem medos, sem pudores, "Flow - À Deriva", do letão Gints Zilbalodis é um dos melhores filmes do século XXI. Um acontecimento estarrecedor, daqueles que além de anunciar um novo autor, nos providencia a oportunidade rara, raríssima de experienciar "cinema puro". O conceito é simultaneamente simples e complexo. Essencialmente, entramos num mundo que pode ou não ser o nosso, onde encontramos apenas natureza, há resquícios do que pode, eventualmente, ter sido intervenção humana, mas, permanecem esquecidos, abandonados, nalguns casos, até consumidos pela vegetação. Um dia, um gato, solitário por natureza, é confrontado com um horripilante dilúvio e, para sobreviver, necessita de se unir a uma capivara, um lémure-de-cauda-anelada e um cão. Segue-se uma odisseia épica, sem diálogos, onde somos convidados (os dissidentes, cas...

"Oh, Canada", de Paul Schrader

Contemporâneo de Martin Scorsese, Steven Spielberg e Francis Ford Coppola, Paul Schrader nunca conquistou o estatuto de "popularidade" de nenhum desses gigantes... e, no entanto (ou, se calhar, por consequência de), é, inquestionavelmente, o mais destemido. Em 1997, "Confrontação", a sua 12ª longa-metragem, tornou-se num pequeno sucesso, até proporcionou um Óscar ao, entretanto, falecido James Coburn. Acontece que, o mediatismo não o deslumbrou, pelo contrário, Schrader tornou-se num cineasta marginal, aberto às mais radicais experiências (a título de exemplo, mencionemos "Vale do Pecado", com Lindsay Lohan e James Deen). Uma das personas mais fascinantes do panorama cultural norte-americano, parecia ter escolhido uma espécie de exílio, até que, "No Coração da Escuridão", de 2017, o reconciliou com o público. Aliás, o filme representou o início de uma espécie de trilogia, completada por "The Card Counter: O Jogador", em 2021, e "O ...