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Crítica: "The Neon Demon", de Nicolas Winding Refn


Título Original: "The Neon Demon"
Realização: Nicolas Winding Refn
Argumento: Nicolas Winding RefnMary LawsPolly Stenham
Elenco: Elle Fanning, Karl Glusman, Jena Malone, Bella Heathcote, Abbey Lee, Desmond Harrington, Christina Hendricks, Keanu Reeves
Género: Terror, Thriller
Duração: 118 minutos
País: França, Dinamarca, EUA
Ano: 2016
Distribuidor: Leopardo Filmes
Classificação Etária: M/18
Data de Estreia (Portugal): 18/08/2016

Sarah: "Who wants sour milk when you can get fresh meat?"
Crítica: Nicolas Winding Refn será, inquestionavelmente, um dos mais fascinantes e controversos cineastas dos nossos dias. Promovido como um herdeiro de um certo cinema provocador na linha do seu compatriota Lars Von Trier (com quem mantém uma relação de rivalidade bastante pública), NWR (como agora passou a assinar) já era um realizador de culto ainda os seus filmes eram falados em dinamarquês, mas só recentemente o seu estrelato se tornou verdadeiramente planetário com o maravilhoso "Drive" (2011). Desde aí, têm sido muitas as tentativas da indústria de Hollywood de o domesticar (com ofertas incessantes para dirigir grandes blockbusters, com orçamentos exorbitantes), mas nada disso apela a um artista, que em anos recentes só se tem afastado mais do mainstream. Primeiro, com o insondável "Só Deus Perdoa" (2013) e, agora com "The Neon Demon" (estreou-se esta semana), seguramente, o seu trabalho menos acessível (anticomercial, não seria uma má etiqueta) e também dos mais prodigiosos. Uma experiência (NWR, já havia dito aquando da estreia no Festival de Cannes, que o que lhe interessava fazer era criar experiências e, não fazer filmes bons ou maus, refutando mesmo a existência dos mesmos) alucinatória, hipnótica e perversa (com ecos de Lynch, Cronenberg e, particularmente, Żuławski), onde acompanhamos a odisseia de Jesse (Elle Fanning, naquela que constitui, facilmente, a sua melhor interpretação até hoje), uma jovem que viaja até Los Angeles na esperança de se tornar modelo, mas uma vez lá é confrontada com um microcosmos violento, depressivo e repressivo, no qual a sua beleza natural é invejada por todas aquelas que a rodeiam e, a sua inocência poderá, eventualmente, demonstrar-se como sendo corruptora. Cinema profundamente simbólico (Refn, não faz nada ao acaso) e transgressivo, mais interessado em fazer perguntas do que em oferecer respostas. Tal como a maior parte dos seus filmes é também uma experiência abstrata, algures entre o real e o etéreo, o cómico e o trágico, é belo (belíssimo, até), estranhamente comovente e altamente perturbador. Se será para todos os gostos, claro que não, mas as obras-primas nunca o são, porque como diz Refn aquilo que não divide não penetra. Percebem-se os 17 minutos de aplausos que recebeu em Cannes.

Texto de Miguel Anjos

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