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"Fuga de Pretória", de Francis Annan

O cinema sempre teve um especial interesse em histórias de pessoas que conseguem escapar de prisões. De "O Presidiário" a "Os Fugitivos de Alcatraz", passando pelas muitas versões de "Papillon", as narrativas centradas em personagens que utilizam o seu engenho para encontrar maneiras de enganar os seus captores nunca falham na hora de chamar à atenção do público. Nesse sentido, "Fuga de Pretória", da autoria do britânico Francis Annan, corresponde a uma valorosa nova adição a esses cânones. Em causa, encontramos a evocação de uma história verídica que começou com a detenção de Tim Jenkin e Stephen Lee (aqui interpretados por Daniel Radcliffe e Daniel Webber), dois ativistas políticos contra o Apartheid, na África do Sul, que foram condenados a passar doze e oito anos, respetivamente, num estabelecimento prisional, onde se encontravam muitos outros homens brancos que ousaram questionar as normas discriminatórias que vogavam naquela nação. No entanto, Jenkin e Lee não demoram a montar um ardiloso plano que lhes permitisse abandonar a instituição… Interpretado com vigor e dirigido com uma atmosfera de intensidade permanente, "Fuga de Pretória" é um olhar contundente sobre uma realidade que não pode nunca cair no esquecimento, um comovente libelo pela união que é também uma evocação fundamental de um momento histórico em que a lei se deixou corromper.

Texto de Miguel Anjos

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