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"Teen Spirit: Conquista o Sonho", de Max Minghella


Uma sinopse é apenas e somente isso. Isto é, uma tentativa de apresentar os acontecimentos que iremos acompanhar num qualquer conto. Contudo, como todos sabemos, o que importa não é aquilo que nos vai ser comunicado, mas sim de que maneira. Enfim, nuances que não podem ser encapsuladas num par de linhas. Lembram-nos desse facto quando descobrimos um filme como "Teen Spirit" (que, em Portugal, possui o subtítulo piroso e patusco "Conquista o Sonho"), um melodrama de raiz profundamente clássica (estamos no território sempre fascinante daquele realismo social muito britânico, que encontra em gente como Mike Leigh e Ken Loach os seus mais celebrados "heróis"), que acaba mesmo por conseguir subverter os clichés mais comuns de uma matriz narrativa cansada.

Violet (Elle Fanning) vive numa quinta na Ilha de Wight, no Reino Unido. A mesma adora música e sonha tornar-se cantora, uma aspiração que a sua mãe (Agnieszka Grochowska) encara como uma ilusão infantil que apenas servirá para a distrair da escola e do trabalho. No entanto, certas noites, Violet sai mais cedo do seu ofício como empregada de mesa para cantar no bar local.

E lá que encontra Vlad (Zlatko Buric), um cantor de ópera caído no esquecimento, que reconhece nela um talento imenso. Poucos dias depois de se conhecerem, chega à ilha o Teen Spirit UK, um concurso que procura revelar jovens cantores, Violet quer participar, mas necessita de um adulto que se responsabilize por ela, coisa que a mãe nunca aceitaria, acabando por convencê-la a pedir auxílio ao improvável Vlad.



Películas centradas neste estilo de competições tendem a resumir-se a banais montagens de momentos musicais (sempre com uma formatação televisiva e umas quantas tentativas de ejectar a suspense no terceiro ato), no entanto, Minghella é melhor cineasta (e argumentista) que isso é, como tal, apesar de se divertir a encenar um trio de atuações opulentas e intoxicantes, decide transformar o restante filme numa peculiar história de amizade entre duas almas solitárias, uma jovem e outra envelhecida, que, por razões diversas, se sentem aprisionadas a uma existência com a qual não se identificam.

Tudo isto, contado com enorme sensibilidade e uma atenção e dedicação incomum ao trabalho do elenco, especialmente, a luminosa Elle Fanning e o enigmático Zlatko Buric. Anthony Minghella, autor de obras como "O Paciente Inglês" e pai do estreante Max, ficaria orgulhoso. 

Texto de Miguel Anjos

Título Original: "Teen Spirit"
Realização: Max Minghella
Argumento: Max Minghella

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