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Crítica:

"Todo o Dinheiro do Mundo"


“Todo o Dinheiro do Mundo”, independentemente, dos seus muitos méritos, permanecerá eternamente conectado a uma produção bem conturbada. De forma mais ou menos simplista, digamos que o filme começou por ter Kevin Spacey no papel do multimilionário John Paul Getty, no entanto, quando surgiram acusações de assédio sexual contra o ator, Ridley Scott resolveu refilmar todas as cenas que o envolviam com Christopher Plummer. Trata-se de uma decisão sem precedentes, que acabou por ofuscar os resultados e, é uma pena que assim seja. É que, esta tarefa hercúlea, não só evidencia Scott como um veterano, capaz das mais admiráveis proezas (e, não nos enganemos, refilmar cerca de metade de uma longa-metragem em menos de duas semanas, é um empreendimento hercúleo), como também reafirma a sua qualidade enquanto contador de histórias. Para tal, evocando o rapto de John Paul Getty III, por um grupo que exigiu ao seu avô um resgate de 17 milhões de dólares, que o mesmo se recusa incessantemente a pagar. Estupendamente bem-atuado (Michelle Williams, em particular, é soberba e, Plummer diverte-se imenso com a extrema “sovinice” da personagem) e dirigido com um apurado sentido de tensão constante, o britânico convida-nos a entrar numa tremenda odisseia, onde se examinam os poderes misteriosos do dinheiro, essa substancia tão desejada que parece conseguir contaminar de formas francamente violentas, até as mais pequenas interações humanas. Enfim, um acontecimento mediático, que esconde um belo filme.


Realização: Ridley Scott
Argumento: David Scarpa
Género: Thriller, Drama
Duração: 132 minutos

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