Crítica: "A Melodia"
O cinema existe também como um espelho do
meio em que é concebido. Seja de maneiras mais cómicas ou dramáticas, realistas
ou fantasiosas, refletindo as preocupações que mais nos inquietam atualmente.
Assim sendo, caso queiramos seguir essa linha de pensamento, podemos mesmo
concluir, que para melhor entendermos os assuntos que marcam a ordem do dia
noutros países, talvez, possamos simplesmente ver os seus filmes. Um bom
exemplo disso mesmo, será a continuada obsessão de algum cinema francês com a educação,
que do terror (“Madame Hyde”) ao drama (“A Turma”, “Uma Turma Difícil”),
passando pela comédia (“Os Profs”), parece assumir-se como uma presença
temática omnipresente, naquela que permanece uma das mais importantes
cinematografias mundiais.
Ora, “A Melodia” conta-se como um novo
capítulo nessa riquíssima tradição. Desta feita, o argumentista e cineasta
Rachid Hami inspirou-se em relatos reais de crianças de bairros
desprivilegiados, onde as mesmas falavam acerca da importância que a descoberta
da música clássica representou nas suas vidas. Para tal, encenando uma
narrativa, que coloca um professor, Simon Daoud (Kad Merad), que ruma até uma
escola nos subúrbios parisienses de forma a preparar uma turma de alunos mal comportados,
para um concerto que reunirá várias outras escolas.
Acontece que num cenário, no mínimo, pouco
acolhedor, Simon descobre que existe entre os seus pupilos pouco ou nada
interessados, um talentoso violoncelista, com um daqueles dons que parecem
estar adormecidos, apenas à espera que alguém lhes dê uma razão para acordar.
E, durante os meses que encapsulam essas aulas, este músico solitário
necessitará de ser essa pessoa, não só para a revelação que mais o fascina,
como para o resto da turma.
Sendo mesmo nessa última parte, que reside o
coração do filme. Isto porque, Hami pensou uma bonita carta de amor à música
clássica e o seu poder de transformação da juventude, mas, no processo, acabou
por construir também uma comovente homenagem à necessidade do trabalho
grupal. É que esta orquestra só poderá funcionar, quando todos os seus membros conseguirem
caminhar e trabalhar no mesmo sentido. E, é precisamente essa odisseia que o
cineasta procura acompanhar, filmando os seus muitos avanços e recuos, sem
pressas, nem artifícios, e conseguindo belíssimos momentos, como uma reunião
entre professores e pais, em que todos parecem dispostos a por de parte a sua
natureza conflituosa, para ajudar os seus filhos. Cinema humanista e
genuinamente realista. Ligado ao seu presente, ao nosso presente.
Realização: Rachid Hami
Argumento: Rachid Hami, Guy Laurent, Valérie Zenatti
Elenco: Kad Merad, Samir Guesmi, Alfred Renely
Género: Drama
Duração: 102 minutos
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